Diálogo Ciceroniano, Erasmo
O holandês Erasmo (1466-1536), espírito independente, liberal e cosmopolita, figura prestigiada junto das autoridades políticas, religiosas e académicas do seu tempo, foi um dos expoentes intelectuais do Renascimento. Deve-se-lhe, entre outras obras, a primeira edição crítica moderna em latim do Novo Testamento, logo retraduzida noutras línguas, e uma famosa sátira filosófica da sua época, o Elogio da loucura (1509). O presente diálogo Ciceronianus (1528), cedo influente nas controvérsias literárias, retóricas e estéticas da Europa do séc. XVI, é também satírico. Com efeito, nos escritos da época predominava, não só o latim (língua dos textos do próprio Erasmo), mas um estilo normativo mimético da prosa de Cícero, o grande escritor e filósofo romano, modelo por excelência do latim literário. Escrever bem era escrever, no estilo e até na linguagem, «puro Cícero». Erasmo, admirador mas não imitador do mestre romano, satiriza aqui essa idolatria literária, esse purismo ciceroniano que, segundo ele, fossiliza, em vez de vivificar, a língua. E contrapropõe, à imitação de um único modelo, a de vários, aquilo a que chama uma «imitação composta».